Cena do filme "Café Teerã"
A primeira edição do Festival Filmes Incríveis, que acontecerá de 1º a 14 de agosto no cinema Reag Belas Artes (SP), com ingressos a 10 e 5 reais, reúne 20 filmes, de 20 países, todos inéditos no Brasil. Para quem acompanhou à distância o Festival de Cannes 2024, seis filmes da Seleção Oficial estão no evento. Que privilégio enorme para o cinéfilo brasileiro, não? E do Festival de Berlim, teremos algum? É claro que sim! Pelo menos três títulos da mais recente Berlinale também estão entre os selecionados. Vamos a um dos destaques de Cannes: o iraniano “Café Teerã”, de Navid Mihandoust (que atualmente está preso em Teerã, por causa de outro filme seu censurado pelo governo local). Através do personagem Sohrab, alter ego do próprio Mihandoust, acompanhamos a rotina de um cineasta que se encontra sob investigação de subversão e, por isso, passa a gerenciar um Café de propriedade de um parente seu. Cheio de referências cinematográficas que todo cinéfilo vai amar, as paredes do estabelecimento são decoradas com retratos de diretores icônicos, com destaque para o polonês Krzysztof Kieslowski. Detalhe: Sohrab é casado e não demora a se envolver platonicamente com uma jovem e extrovertida vizinha, que vai ao Café pedindo a ele permissão para fazer uma performance no local e, daí em diante, se torna presente quase o tempo todo causando mais confusão na vida do já visado cineasta, inclusive no casamento dele. Homem casado de meia-idade, jovem vizinha... Pensou em “O Pecado Mora ao Lado”? Talvez haja alguma inspiração, sim. Mas, vale lembrar que “Não Amarás”, clássico de Kieslowski, também é sobre uma relação (platônica e voyeur) de um adolescente por sua vizinha mais madura. Segundo o crítico Roberto Rezende, em seu excelente texto publicado na WOO! Magazine, “Café Teerã” é um filme “sensível e provocador na medida certa, ao retratar um artista inconformado com o regime de censura do seu país”. Vale lembrar que no dia 1º de agosto, às 19h, a iraniana Neda Mihandoust, irmã do diretor, participará presencialmente da sessão do filme no Reag Belas Artes. Leia abaixo a análise completa de Roberto Rezende.
A Arte como Forma de Resistência
Por Roberto Rezende
Cena do filme "Café Teerã"
Fazendo parte da Mostra de Filmes Incríveis no complexo do REAG Belas Artes, Café Teerã, traz a difícil vida de um cineasta, o iraniano Sohrab, que pelas convenções do governo de seu país, está sob investigação de subversão e por isso, está trabalhando e cuidando de um Café do seu cunhado.
Entre interrogatórios semanais, onde seu interlocutor não tem rosto e sua rotina de comunicações pelo celular com sua esposa que longe e estudando, conhece uma jovem artista de teatro que solicita o espaço do café para realizar performances experimentais e possivelmente consideradas contraventoras ao regime do Irã.
Inteligente, sensível e irônico, Sohrab começa a interagir com a jovem e passa os dias discutindo sobre filmes de diretores, dos quais mantém fotos nas paredes do café enquanto aguarda a avaliação final que decidirá sobre sua sentença ou pelo regime.
O filme é direto ao trazer as idiossincrasias do artista retratando suas angústias, especialmente quando em sua residência, ele se depara com um objeto de certa forma perturbador dentro de um frasco que ao mesmo tempo lhe faz companhia, ouve seus devaneios e serve de motivo para se distanciar de sua zelosa esposa, Mahgol.
E é principalmente na cinematografia de Krzysztof Kieślowski, que reside o estudo da psique do protagonista, sobre a preocupação moral dos costumes de um país regido por leis arcaicas, o movimento realista que trata das questões sociais e temas morais complexos que percorre e são caros à obra do cineasta polonês.
A cinematografia com cores pálidas, translúcidas, exibe o estado de espírito de Sohrab o personagem principal, bem como sua relação com toda as pessoas em seu entorno, desde sua esposa, seu advogado, seu pai (protagonista de um dos seus filmes que ainda está na fase de edição) e sua insuspeita pupila, o que gera uma agradável sensação de cinefilia a quem tem o mínimo de familiaridade com a obra cinematográfica de Kieślowski.
Cena do filme "Café Teerã"
Uma obra de arte sensível ao mesmo tempo em que é provocadora com interpretações na sua maioria corretas, calcada na tolerância, na esperança e que resvala na falta de comunicação em algumas fases da vida em que abrir mão de suas convicções é bem mais difícil do que perder a quem nos ama e apoia, principalmente, quando se leva em consideração a forma como fomos criados e dependendo claro, do país e do regime em que vivemos.
Escrito e dirigido com argutas observações pelo diretor e roteirista Navid Mihandoust, conforme programa no site do REAG Belas Artes, no dia 1 de agosto, às 19h, a iraniana Neda Mihandoust participará da sessão de Café Teerã, dirigido por seu irmão.
Isso porque infelizmente , Navid está preso em Evin, no Teerã, condenado a três anos de reclusão por acusações injustas relacionadas a um documentário que ele realizou em 2009, sobre a vida profissional da jornalista e ativista dos direitos das mulheres, Masih Alinejad, uma obra que nunca foi lançada.
FESTIVAL FILMES INCRÍVEIS
Quando: De 01 até 14 de agosto
Onde: Cine REAG Belas Artes
Valores: R$10,00 e R$5,00 (meia, para estudantes e melhor idade). Poltronas numeradas. Em todas as salas, cadeiras adequadas para obesos e espaço para cadeirantes.
Ingressos: Na bilheteria ou pelo site.
Endereço: REAG Belas Artes (R. da Consolação, 2423 – Consolação)
Telefone: (11) 2894-5781
Imagem de divulgação do evento com o filme "Café Teerã"
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